terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

Aurora


Deram-me asas.
Alegrias instantâneas de súbito acometeram-me.
Voei.
Vislumbrava, do alto, as formas assimétricas subentendidas entre metal e alvenaria.
Curioso como tudo parecia sereno dali.

Senti o torpor.
Aproveitei-me da simplicidade.
Deram-me as asas.
Provei da sensação orgástica.
Poderia dizer que não precisaria de nada mais.
Voar supria necessidades.
Mas cortaram-me as asas.

Mal deleitara-me do momento
De repente, nada funcionava como antes.
Engrenagens metálicas caíam de algum lugar.
Penas, escamas, derme e epiderme.
Cortaram-me as asas.

Já não sobrara cor, não sobrara fôlego.
Apenas um corpo desfalecido caindo em direção ao asfalto.

Dizem que antes de morrer acometem-lhe uma enxurrada de memórias, então
esperei o desejado momento de reflexão antes do fim.
O que eu fizera para meu agressor cometer tamanha atrocidade? Não lembro.
Quem cortara-me as asas? Eu não sabia seu nome.
Talvez eu pudesse enaltecer-me quando chegasse a hora.
Mas se a necessidade fosse de redenção, não teria humildade suficiente.

As asas me foram o maior bem ofertado.
Ao que eu venerava e cultuava com egoísmo.
E estas foram arrancadas de mim.

Nada aconteceu.
Eu continuara a cair e nenhuma reminiscência acometeu-me.
Fora esquecido e não tivera direito a ressalva.
Diziam-me que era pássaro livre.
E agora, o que restara de mim?
Apenas um acervo putrefato de ossos e pele
E a estranha sensação de bolor percorrendo as entranhas.

Meu corpo chegara a terra.
Alguém escutara o grito?
Não posso dizer.
Agora os sentidos estavam paralisados.
Meu córtex apenas martelava: 
Cortaram-me as asas!

Oh, liberdade,
doce liberdade!
Quem dera sentir teu gosto outra vez…

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          Escrito por Thais Lima, há algum tempo e retomado há pouco. É mais uma daquelas poesias, se assim pode-se classificar, em que você escreve e depois para, volta a escrever e para novamente. Tudo depende do momento. Imagem encontrada aqui.

          Bom, passamos um belo tempo sem postar. Foram mais de três meses, mas agora estamos de volta! Ou pelo menos procuramos estar.

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