De início, um ponto. Foi aquele “bom dia”
com um sorriso despertador pela manhã. Aquele breve aceno com a cabeça – sem
intenções maldosas – que meus olhos captaram, aqueles sorrisos desviados de
forma adorável. Tudo restrito. Uma endemia!
Algo constante. Somente aquele ponto. E naquele mesmo lugar, vários pontos
foram se formando. Não eram furos. Eram complementos. Eram “bons dias” dados,
acenos com a cabeça, uns sorrisos meigos de outros dias... vários, e vários
pontos. Estavam se ligando, formando algo estranho. Uma figura abstrata.
Ameaçadora, acolhedora, dispensável. Eu não soube reconhecer. As constâncias
sumiram, não estava mais nada restrito. Aconteceu. Formou-se. Uma epidemia! Parecia uma boa escolha. Aquilo
não era uma solução. Era perigoso. Não me
importava com o perigo!
Tudo passou a ser você. Todos os breves
momentos, os longos, os que não existiam. Os
necessários! Não sabia dizer o que tudo isso criou em mim. A figura era tão
utópica, surreal. Distante. Inenarrável. “Não
é algo que se veja todo dia por aí!” – a frase chegava como um sussurro –
quase informando que eu devia orgulhar-me disso. O problema que até mesmo os
médicos espantaram-se. Eles me informaram: “Faz
muito tempo que isso parou de funcionar!”. Seja lá o que for, estava
trabalhando numa velocidade que não eu podia controlar. Nem sempre culpa de sua
presença, mas dos pequenos momentos que estavas em minhas reminiscências.
A informação circulava em meu corpo. Estava
tudo contaminado. Uma pandemia! E por
mais contraditório que seja, quando mais precisei da sua presença, mandaram-me
ficar isolado. Fugir do perigo. Estava no último nível... E como você estava?
Não sabia dizer. Disseram-me que o melhor remédio era: “Rezes para que não tenhas reciprocidade”. E balançavam a cabeça
como se eu fosse um coitado. Estava desnorteado. Por que deveria fugir de algo
que sei da minha capacidade de agir diligentemente? Ou só acreditava que podia?
Conheço meu estilo de provar que sou capaz... Fizeram mais exames. O resultado foi: “Coração, sinto muito!”.
O caso repercutiu. Muitos diziam: “Tolo ou perigoso?”. Senti-me tão
contaminado. Será que não teria mais cura? Desejei que meu cérebro voltasse a
pulsar. Essa era também sua função. Como foi tão desleixado em permitir que
outra coisa fizesse isso? Uma pandemia!
Talvez ele só não tenha resistido aquele sorriso, aqueles olhos... aquele. Tomei todos os remédios, estava
melhorando, os pontos pareciam está sumindo. Não que eu estivesse feliz, mas
estava aliviado. Levar aquela figura abstrata sozinho era ruim. Parecia que
tudo ficaria bem, até anunciarem: “Você
tem visita!”. Era estranho, nunca recebi visitas. Enfim, estava
melhorando... Daí aquilo entrou, e seus olhos fitaram-me fazendo meu cérebro parar!
E só meu coração pulsar forte, descontroladamente. Você se aproximou, e eu
percebi que eu não era o único contaminado. Ele também tinha um coração, batia
estrondosamente.
– Você rezou como eles mandaram? – ele perguntou.
Eu só consegui rir. Mas minha figura abstrata
respondeu: “Em nenhum momento!”.
***
Escrito por Marcos Soares.
Inspirações numa aula de Biologia.
Esplêndido! Não tenho palavras - talvez porque eu me identifique com o texto e com o momento. Mas muito bem escrito (como sempre), harmônico, emoções sucedidas, explicitadas. Muito bom.
ResponderExcluirEu simplesmente ADORO esse jeito que Marcos tem de expressar e explicar tantas emoções sem transformá-las SÓ em teoria ou grafia correta.
ResponderExcluirMais uma vez, um trabalho incrível!
Fique com os beijos de sua eterna fã.